segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

O que fazer com a criança que “molha a cama”?

Crianças em idade escolar que “molham a cama”

O fato de crianças escolares entre 8 e 14 anos urinarem na cama durante a noite, de forma involuntária (chamada, em medicina, de enureses), é bem mais comum do que os pais julgam poder acontecer. Em estudo conduzido nos Estados Unidos, 20% dos escolares no (primeiro grau) apresentaram, ocasionalmente, enurese noturna (o nome pelo qual os médicos identificam este fenômeno). Uma minoria, ou seja, 4% dos escolares “molham a cama” mais de 4 vezes por semana. O fenômeno é muito mais comum em meninos do que em meninas (meninos 7 a 9%, meninas 3 a 6%).


As causas que levam a criança a “molhar a cama” durante o sono podem ser originarias de distúrbios emocionais. É bem conhecido o fato de que, para uma criança em idade escolar, o nascimento de um irmão ou uma irmã leva a atitudes de “ciúmes”, sensação de perda da exclusividade de ter os pais só para si, o “seu” espaço na casa terá de ser dividido e, mesmo com toda a preparação da criança durante a gravidez, os sintomas emotivos surgem no decorrer do nascimento, da amamentação e do desenvolvimento do irmão (irmã). Havendo uma causa orgânica, por exemplo, uma bexiga de baixa capacidade de armazenamento, a criança passará a não controlar a emissão de urina à noite. Pais pouco compreensivos, mal informados, ou que não falam com o pediatra, podem piorar a situação, zangando-se com a criança, chamando-a de nomes impróprios, apontando a vergonha de ter a cama molhada, enfim, piorando o sentimento de culpa da criança. Outro rude golpe emocional para criança é a separação dos pais, o fato dos pais darem mais sinais de afeto e amor a outro irmão (irmã) criando um ambiente emocional predisponente a uma manifestação física – a enurese.



Mecanismos que favorecem a enurese.

Embora pareça trivial, o fato da criança ter constipação intestinal é um fator desencadeante de enurese.  A massa fecal no intestino, na região chamada sigmoide, no lado esquerdo do abdômen, pode comprimir a bexiga, reduzindo a sua capacidade de armazenar a urina. Mais uma vez, se a criança já tem uma bexiga de baixa capacidade, este fator adicional irá provocar a emissão involuntária noturna de urina. Este fator (constipação intestinal) pode chegar a 36% das crianças que são trazidas ao médico. Por outro lado, a observação cotidiana do hábito de tomar líquidos indica que a maioria dos escolares não ingere líquidos durante a manhã e boa parte da tarde. Chegam a casa com muita sede, pelos exercícios comuns da vida escolar, e ingerem a maior parte dos líquidos necessários ao fim da tarde e à noite. Tal fato irá propiciar uma bexiga muito “cheia” antes de dormir e a criança deve ser instruída para esvazia-la antes de ir para a cama. No entanto, o resíduo de urina vesical é maior em criança com baixa capacidade volumétrica da bexiga e tal fato pode levar a enurese. Infecções urinárias (cistite), mais comum nas meninas, é outra causa freqüente de enurese. Dor à micção, ardor durante o ato miccional, freqüentes idas ao banheiro são sintomas de cistite. O exame de urina irá confirmar a infecção a qual deve ser prontamente tratada.


Exames que podem ajudar no diagnóstico.

É imperativo o exame completo da urina colhida, se possível, em frasco adequado e no laboratório. Com este exame, afasta-se a presença de “açúcar” na urina (diabetes), infecção urinária (cistite) e doenças renais. Outro exame muito importante é a ultrassonografia da bexiga, a qual deve estar “cheia”. Mede-se a capacidade da bexiga, destacando-se se a criança tem baixa capacidade de armazenar líquido.  Verifica-se, igualmente, se após a criança esvaziar a bexiga, quanto de resíduo permanece dentro da bexiga. No caso de haver resíduo maior que o normal, indica que a criança é incapaz de esvaziar completamente a bexiga e que, inevitavelmente, irá facilitar a emissão noturna.


Tratamentos aconselhados para a enurese

A terapêutica de enurese visa fazer cessar a emissão involuntária durante a noite e suas consequências para a criança, a qual se sente envergonhada, com baixa autoestima, e “diferente” de outras crianças.Três tipos de tratamentos deverão ser considerados. A decisão de iniciar a terapêutica nunca deverá ser baseada na afirmativa de que “quando crescer este problema de molhar a cama irá desaparecer”. O tratamento comportamental é baseado no fato de que a criança deverá ter hábitos intestinais e urinários normais durante a vida diurna.A criança deverá esvaziar a bexiga antes de dormir, ingerir pouco líquido até o momento de ir para a cama e ter todo apoio psicológico dos pais e irmãos. A motivação para dar continuidade a um programa físico e emocional demanda um bom terapeuta (psicólogo). Estudos realizados em crianças com enurese indicaram que cerca de 60% tiveram “cura” da enurese em 6 meses ou mais.


O método do alarme

O método do alarme deve ser um dos primeiros a ser utilizado, pois sua eficácia é excelente. Neste método, um dispositivo colocado na cama emite um alarme sonoro quando o líquido vesical é vertido. Com o alarme, a criança e os pais acordam. Cria-se o que se chama de reflexo condicionado, isto é, alarme – enurese - ato de acordar – solução para o problema.  A eficiência deste sistema é surpreendente: em mais de 3000 crianças estudadas com enurese, o alarme conseguiu “a cura” da enurese em mais de 65% das crianças. Depois que o “sistema de alarme funcionou”, a imensa maioria das crianças deixa de apresentar a enurese.


Métodos que empregam remédios

O nosso corpo secreta hormônio pela hipófise posterior que é chamado de hormônio antidiurético. A indústria farmacêutica já produz um agente químico similar chamado de desmopressina, o qual deve ser ingerido por via oral com a recomendação da criança não tomar água antes e após dormir (isto é, acordar para tomar água). Isto porque esta substância pode reter excesso de água levando a que se chama de “intoxicação aquosa”. A desmopressina é altamente eficaz na eliminação da enurese (68%) e,  novamente, as crianças que não tiveram o problema resolvido tinham diminuta capacidade vesical.A conclusão final mostra que a enurese é frequente em crianças, devendo ser tratada pelos métodos indicados para o bem estar pleno e emocional da criança.

Geraldo Medeiros